Tia Amélia

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Hoje em dia chamamos carinhosamente de pianeiros os pianistas que atuaram entre segunda metade do século XIX e primeira metade do século XX no Brasil, até o surgimento da Bossa-nova mais especificamente. Eles são um verdadeiro elo perdido na história da música popular brasileira. Pianistas como Ernesto Nazareth e Chiquinha Gonzaga são lembrados hoje em dia, porém se fala pouco em seus contemporâneos como Aurélio Cavalcanti, Chirol, Viúva Guerreiro, Arthur Camilo, Oswaldo Cardoso de Menezes e tantos outros. Pouco também se fala dos pianeiros que já vivenciaram a era da gravação como Radamés Gnattali, Carolina Cardoso de Menezes, Gaó, Bené Nunes, Lina Pesce, Muraro e por ai vai. Tão grande foi meu impacto quando descobri que existia esse pianismo brasileiro que imediatamente comprei todos os raros LPs que encontrei. Percebi inúmeras qualidades nessa forma de tocar piano, mas uma em especial: todos tinham muito gingado e técnica! Pude também responder a uma questão que sempre tive comigo que estava relacionada com o que aconteceu com piano brasileiro entre o Ernesto Nazareth e Dick Farney, ou seja, entre o início da música popular brasileira e a Bossa nova.

Nessa história entretanto há uma personalidade que considero muito especial e acho ainda mais incompreensível que sua música esteja se perdendo: Amélia Brandão Nery, a Tia Amélia. Tia Amélia era uma verdadeira gigante no choro! Uma pianista incrível! Tinha uma mão esquerda que era um verdadeiro um moto perpétuo. Fazia uma música muito alegre, viva e saltitante. Compunha choros lindos e interpretava com muita originalidade e maestria músicas de outros compositores, seja tocando solo ou com banda.

Nascida em Jaboatão dos Guararapes (PE) em de 1897, começou a estudar piano aos 6 anos de idade se dedicando aos clássicos por imposição do pai. Casou-se aos 17 anos e, como era muito normal naquela época, a oposição do marido a impediu de seguir a carreira de pianista conforme pretendia. Ficou viúva aos 25 e só ai, já com 3 filhos para criar, decidiu ingressar na vida artística profissionalmente. Ficou mais conhecida depois que passou a se apresentar em rádios como Rádio Clube de Pernambuco, Mairink Veiga e Rádio Nacional e a fazer concertos pelo Brasil e pelas Américas. Após cerca de 17 anos afastada dos palcos voltou a se apresentar incentivada pela cantora Carmélia Alves.  E a partir dessa fase além do rádio trabalhou na tv em importantes emissoras como TV Tupy e TV Rio.

Apesar de as partituras serem raras – e esse é um dos principais motivos de sua música estar sendo esquecida – Tia Amélia felizmente registrou seu legado em gravações de discos 78rpm, compactos de 45rmp e LPs. Discos incríveis como o Velhas Estampas eternizaram composições maravilhosas como Bordões ao Luar, Dois Namorados e Olinda.  Seu último disco lançado foi pelo selo Marcus Pereira, o LP “A Benção Tia Amélia” quando já tinha 83 anos. No encarte desse disco há uma excelente frase de José Ramos Tinhorão:  “Assim, quando se ouve o som atual de Tia Amélia, pode-se dizer que é toda a história do piano popular brasileiro que soa em sua interpretação”.

E seguimos ouvindo e aprendendo a arte de se tocar piano, sempre com esses grandes mestres e seu legado na esperança de que cada vez mais e mais pessoas se interessem por essa música incrível!

 

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